domingo, 10 de janeiro de 2010

Entrevista do Pré-candidato à presidência do Brasil Plínio de Arruda Sampaio do PSOL à Caros Amigos


Entrevista: Plínio Arruda Sampaio

“O Psol é um partido socialista e a Marina não é socialista”


Por Hamilton Octavio de Souza e Tatiana Merlino




A partir deste mês, a Caros Amigos inicia um debate sobre o que está em jogo nas eleições presidenciais de 2010. Entrevistas, análises e artigos discutirão as propostas e programas das candidaturas do campo democrático e popular. A primeira entrevista da série “Eleições 2010” é com o advogado e presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), Plínio Arruda Sampaio, pré-candidato à presidência da República pelo Psol.

O partido está dividido em relação à candidatura ao principal posto do Executivo. Parte do Psol defende a candidatura própria e apoia o nome de Plínio. Outra é favorável a uma aliança com o PV em torno da candidatura da senadora Marina Silva (PV-AC). A aproximação do PSOL com o PV aconteceu porque a ex-senadora Heloísa Helena (PSOL-AL) descartou a possibilidade de concorrer às eleições presidenciais para tentar voltar ao Senado.


Caros Amigos - Qual a importância do Psol se lançar com uma candidatura própria?

Plínio Arruda Sampaio - A importância está estreitamente relacionada com o objetivo da burguesia em relação a esse processo eleitoral. Há um script montado para essa campanha, para fazê-la de uma maneira suave, morna, fazer da discussão apenas uma coisa técnica e fugir dos verdadeiros problemas e das verdadeiras soluções. Há um processo de distorção do processo eleitoral para que ele não debata nada. E é fundamental desfazer essa farsa, é fundamental que exista uma voz capaz de dizer: “olha, isto aí foge da realidade, não é uma visão real do que está acontecendo no Brasil”. Qual é a dificuldade e a necessidade disso? É que toda a realidade social tem dois planos. Um plano é o da superfície dos eventos, onde estão acontecendo as coisas. E há um plano embaixo, onde estão os processos, as tendências. Esse não se vê sem instrumentos de análise. Em cima, na superfície, as coisas melhoraram para o homem simples do povo porque o Lula é menos perverso do que o Fernando Henrique, ele tira menos dos pobres. E porque a conjuntura externa favorece a entrada de capitais aqui. Então, como há uma entrada enorme de capitais, pode se remunerar a burguesia com tudo que ela quer, e sobrar umas migalhas para soltar para o povo. As Casas Bahia estão vendendo, tem lan house em tudo quanto é lugar da periferia, o pobre está começando a ter automóvel porque há uma produção brutal da indústria automobilística e os usados caem na mão dos mais pobres por um preço razoável. Mas o ritmo da melhoria é tão lento que não sei quando vamos deixar de ter pobre na rua. E, dados os processos que acontecem embaixo, provavelmente essa melhoria acaba logo adiante. O primeiro problema econômico que tiver, essa melhoria vai para o buraco.

O que está acontecendo embaixo é grave, porque o preço dessa aparente abonança superficial é a entrega do país, o aprofundamento de processos gravíssimos, como a educação, que está sucateada, a escola que não ensina, a saúde está uma desgraça. O quadro social está ficando impossível. Há zonas do Rio de Janeiro em que não há mais soberania do Estado brasileiro, é o bandido que manda lá. Na periferia daqui de São Paulo é a mesma coisa. Há um processo perverso embaixo, que afeta a moral do povo, essa ideia de que não tem solução. É preciso que isso venha à tona. A campanha é exatamente para isso, para denunciar essa farsa e propor soluções reais. Essa é uma campanha socialista na medida em que aponta as soluções reais, com um programa anti-capitalista. São questões que geram indagações sobre a viabilidade do capitalismo e colocam concretamente a questão do socialismo.


E quais seriam as consequências para o partido caso o Psol apoiasse a Marina Silva?

Seria a negação do Psol, porque esse é um partido socialista e a Marina não é socialista. O PV é um partido do governo. A Marina cria uma dificuldade enorme de palanque para a nossa gente. Como é que você sobe num palanque junto com um cidadão que apoia um governo que nós combatemos dia e noite? O problema da Marina é o seguinte: ela levantou uma questão muito importante, tornou-se um símbolo disso, mas ela perdeu o timing da demissão. O político precisa saber assumir um cargo e se demitir desse cargo. Ela demorou demais e teve que engolir coisas que não são aceitáveis: ela assinou o decreto dos transgênicos, assinou o decreto que libera as florestas, ela foi contra o Dom Cappio, ela apoia a transposição do São Francisco. A contrariedade à transposição do rio São Francisco é ponto do nosso programa. Como é que nós podemos ter uma candidata que tem pontos contrários ao nosso programa? Por isso há uma reação muito forte na base do partido contra a candidatura Marina. E nessas alturas, dificilmente ela passará.


E por que o senhor é o nome ideal para candidato do partido?

Não sou eu quem acha, acharam. Vários grupos vieram me procurar, sobretudo por algumas características: eu tenho uma linha de coerência há muito tempo sobre essas coisas todas. Segundo, eu tenho uma possibilidade de unidade da esquerda muito grande porque tenho um diálogo muito bom com as outras forças socialistas. Aí eu fui procurado por pessoas do Psol e autorizei a usar o meu nome. Eu tenho uma história em todos esses campos, como na reforma agrária. Eu posso, tenho condições objetivas para fazer essa campanha de denúncia da farsa e de proposição do avanço. É uma campanha para o futuro. Não é uma campanha saudosista nem moralista. É uma campanha ideológica no sentido bom da palavra, de que ela se funda em valores do socialismo, mas é concreta para colocar os problemas e as soluções de hoje. Por exemplo, o nosso programa diz “reforma agrária anti-latifundiária”. É uma formulação genérica. O que eu penso que deveríamos fazer na nossa campanha é pegar essa formulação genérica e ir falar com o MST. “Como é que vocês estão vendo a questão agrária, e qual é a solução que vocês vêm?”. São várias, tem que melhorar o crédito, aumentar o programa de compras antecipadas, melhorar assistência técnica e dar uma forte radicalizada, o movimento social, não nós. O MST junto com a CNBB e vários movimentos do campo estão fazendo uma campanha para que ninguém possa ter mais do que 1500 hectares de terra no Brasil. Isso é revolucionário, mas não tem nada de socialista, isso é capitalismo. Só que é anti-capitalista no sentido de que o capitalismo não suporta isso. Esse é o tipo de trabalho que temos que fazer para apresentar o programa do partido.


Como tem sido o apoio interno dentro do Psol à sua pré-candidatura?

O Psol tem umas três correntes majoritárias que são muito fortes e uma série de outras correntes pequenas. As menores praticamente estão todas comigo, e as maiores estão divididas. As cúpulas favorecem uma candidatura mais ampla e as bases querem uma candidatura mais nítida. Então, nesse momento, o grande problema é discutir qual é a tática. Acho até que eles tem certa razão, sem dúvida o partido precisa eleger deputados para que o povo tenha uma voz no Congresso e para ter um mínimo de representação institucional necessária para existir. É legítima a preocupação, mas é equivocada no seguinte sentido: este é um valor, mas há outro valor, que é a imagem do partido. Que é a esperança que o partido traz. Se ele se coliga com figuras que o povo está rejeitando, vão perguntar: “mas então, que partido é esse?”. Eu acho que esse é o primeiro equívoco. O segundo é: esta ideia de que uma campanha mais nítida não traz votos é equivocada. Você pode ter uma campanha nítida e eleger representantes, e essa é uma das minhas preocupações. Eu organizarei a a campanha não só para dar esse recado maior, mais amplo, mas também para favorecer a eleição de deputados, mas sem abrir mão da nitidez da imagem do partido, da nitidez do programa.


Se o Psol se diluir agora não haverá nenhuma força socialista na disputa?

Nada, além do que isso provocará uma dispersão da esquerda e aí três candidatinhos com muito pouco voto não resolvem nada.


Quais seriam as alianças que estariam dentro desse campo e que permitiriam uma disputa sem essa perda de imagem?

Esse é um ponto a favor da minha pré candidatura. É a unidade das esquerdas. Se eu for candidato, é quase certo que marcharemos unidos os três, Psol, PCB e PSTU. Eles já lançaram candidatos, mas isso é normal e também não é uma coisa final. Uma vez acertada a minha candidatura, vamos fazer a unidade da esquerda. Se dirá que os três são fracos, mas dispersos são mais fracos, e juntos têm uma certa sinergia. E depois tem os movimentos populares, que também estão divididos. A divisão é um traço da época, que é de incerteza muito forte. Todo mundo está inseguro, o pobre, a classe média e o rico. Na era de incerteza é normal que um grupo vá para cá e o outro vá para lá...É normal que MST, CPT, MAB, MPA estejam divididos. Mas eu tenho a impressão que se tivermos uma candidatura unitária da esquerda, no primeiro turno esse grupo estará fechado conosco. No segundo turno, provavelmente tomarão posições eventualmente distintas. Isso se não formos para o segundo turno, o que é bem provável.

O discurso do PT dessa ampla frente que está no governo é o da luta contra o retrocesso, representado pelo PSDB, pelo DEM, o grupo que já esteve no governo e já demonstrou ser pior do que esse. Como entrar no contraponto desse discurso, que é muito forte?

É o discurso do mau menor, que é um discurso circular. Você não vai adiante de jeito nenhum com esse discurso, apenas reduz a perda, coisa que também tem um fundamento sociológico profundo. Toda vez que uma nação sofre um golpe muito grande, para a geração seguinte é terrível. Na primeira guerra na França, a geração que se seguiu não tinha filhos. Ela se fechou, não procriava de medo do filho ir para a guerra. A geração espanhola que viveu a guerra da Espanha, enquanto o Franco não morria, morria de medo, não fazia nada. É preciso apontar um futuro, trazer ânimo. Por isso que a campanha nítida é importante. Ela é uma campanha que pode ser feita com vistas a uma afirmação muito forte de coragem, coerência e de apontar um futuro mesmo, dizer: “não fiquem com essa coisinha de reduzir o prejuízo. Pensa grande, vai para a frente”. É uma campanha que pode atingir muito a juventude, pela sua própria idade, configuração, ela vê o futuro. Essa é a estratégia que eu pretendo usar se for candidato.


E quais seriam as principais diferenças da política programática do Psol com uma candidatura única e do Psol apoiando a Marina?

Como é que nós vamos falar no transgênico, como é que vamos falar na transposição? Ela assinou tudo. Tudo que nós contestamos ela assinou. Então é uma dificuldade enorme e por isso que a base do partido está dizendo “não, isso não é possível”. Somos um partido socialista. A base do partido quer a afirmação do nosso projeto. E essa seria uma campanha de um outro projeto, que não é o nosso.


Como o senhor avalia o Psol hoje, depois de sete anos de existência?

O Psol é uma força. Há no país uma porcentagem relativamente pequena de pessoas que não aceitam o que está acontecendo, com valores distintos, mas de maneira geral, com valores sociais, coletivos, visão de nação, de coesão nacional. Em várias camadas sociais. Esse pessoal é naturalmente Psol. Porque os outros dois partidos à esquerda tem uma penetração, mas uma forma de atuar muito mais estrita, de modo que caminham mais lentamente. O Psol é um pouco o desaguadouro, naturalmente. Mas o Psol precisa –e essa campanha é importantíssima para isso – nuclear e organizar esses setores dispersos para começar uma caminhada. Ninguém tem grandes ilusões de que nós temos condições de muito sucesso a curto prazo. Isso é uma ilusão. A derrota sofrida pelo povo foi imensa. Nós estamos juntando os cacos para recomeçar.


Um apoio à candidatura da Marina, que está num partido que não é de esquerda não seria uma derrota para um partido que se afirma socialista?

É isso que eu estou dizendo para o pessoal. Isso não é uma avanço, é uma acomodação. E o partido socialista não se acomoda. A característica do socialista é a não acomodação a qualquer coisa.

É pegar o ônibus errado...

Exatamente, vai para outro bairro. A ideia é essa, fundamentalmente. Chegar, ouvir os movimentos populares, fazer um programa sólido, é um programa ainda com base na sociedade de produção de mercadorias, porém esticando essa realidade e criando uma dinâmica de transformação social.


Qual é o seu calendário para os próximos meses?

Eu vou correr o país, é uma pré candidatura. O país todo está me chamando para fazer reuniões, pequenos núcleos que nós temos. Segundo, estou montando um forte esquema de internet porque nessa campanha a Internet vai dar um grande passo.

para saber mais sobre a pré-candidatura de Plínio acesse: http://pliniopresidente.com/

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